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O novo vizinho de cima

Trilha recomendada para ouvir enquanto lê

Quando eu era adolescente, a gente morava num prédio antigo no centro da cidade. O tipo de lugar onde os vizinhos se conheciam pelo nome, as crianças brincavam no corredor, e o zelador sempre tinha uma história estranha sobre as coisas que aconteciam por lá.

Nosso apartamento ficava no terceiro andar, logo abaixo de um que estava vazio havia meses. Meu quarto era pequeno, mas ficava de frente pra rua, e eu gostava de dormir ouvindo o barulho dos ônibus passando e as conversas abafadas do pessoal do boteco da esquina.

Os passos

Uma noite, enquanto eu terminava um dever da escola – lembro que era algo sobre as pirâmides do Egito, porque tinha um atlas aberto na mesa – comecei a ouvir passos no apartamento de cima. No começo, achei que fosse alguém fazendo manutenção ou arrumando algo. Mas era tarde, quase meia-noite, e os passos pareciam desordenados, como se alguém estivesse andando sem rumo.

Fui até a sala e perguntei pra minha mãe se ela tinha ouvido. Ela só balançou a cabeça e disse:
— Deve ser coisa da sua cabeça. Vai dormir.

Voltei pro quarto, mas o barulho continuava. Passos, arrastando móveis, como se alguém estivesse reorganizando o espaço. Aquilo durou horas. Finalmente peguei no sono, mas acordei com um estrondo forte, como se algo muito pesado tivesse caído no andar de cima.

Na manhã seguinte, antes de ir pra escola, perguntei ao zelador se alguém tinha se mudado. Ele olhou pra mim como se eu fosse louco e respondeu:
— Não tem ninguém lá. Aquele apartamento tá fechado desde o ano passado.

Algo no meu teto

Aquilo me deixou inquieto, mas tentei ignorar. Talvez fosse algum animal ou coisa do tipo. Mas, naquela noite, os passos voltaram. Mais altos. E, em certo momento, algo mudou. Em vez de se moverem pelo andar de cima, começaram a soar como se estivessem… no teto do meu quarto.

Meu coração disparou. Fiquei debaixo das cobertas, tentando não me mexer, até que ouvi o som mais estranho: uma risada baixa, quase infantil, mas que vinha junto com uma respiração pesada.

Corri pro quarto da minha mãe e contei tudo. Ela parecia assustada, mas tentou me acalmar, dizendo que era só o prédio rangendo ou um eco vindo de outro andar. No entanto, naquela mesma madrugada, enquanto estávamos na sala tentando dormir juntos no sofá, o lustre do teto começou a balançar, como se alguém estivesse andando direto sobre ele.

No dia seguinte, minha mãe chamou o zelador e subiu com ele até o apartamento de cima. Eles disseram que estava tudo em ordem, sem nenhum sinal de que alguém tivesse entrado. Mas, quando voltaram, o zelador me chamou num canto e, com um olhar sério, disse:
— Você sabe que esse prédio é antigo, né? Dizem que, antes de ser residencial, isso aqui era um hospital. Às vezes, tem coisas que ficam, entende?

Depois daquele dia, os barulhos ficaram mais raros, mas, de vez em quando, ainda dava pra ouvir o som dos passos. A gente acabou se mudando no final do ano. Mas, até hoje, quando ouço algo estranho no andar de cima, fico esperando aquele momento em que os barulhos param de fazer sentido e começam a parecer… outra coisa.