1 de Junho de 1924
Eu, João Freire Mendes, iniciei hoje minha jornada de Serra Verde para a obscura e quase esquecida aldeia do Vale da Lua. Minhas pesquisas sobre o folclore arcaico da Nova Inglaterra me levaram a investigar histórias sobre rituais antigos e entidades indescritíveis que teriam se originado nestes ermos. Pouco conhecia além dos rumores e fragmentos de lendas que encontrei em manuscritos antigos, mas minha curiosidade foi aguçada por referências a práticas ocultas e sacrifícios.
Chegada ao Vale da Lua
Ao descer na estação, um sentimento de inquietação apoderou-se de mim. A estrada de terra que levava ao Vale da Lua era cercada por árvores altas e retorcidas, cujas copas pareciam sussurrar segredos antigos ao vento. Enquanto avançava, notava sinais de abandono: cercas quebradas, postes de luz caídos e o ocasional som de animais desconhecidos. À medida que me aproximava da aldeia, o céu escurecia, e um frio sobrenatural invadia meus ossos. As poucas casas que encontrei eram decrépitas, feitas de madeira envelhecida e pedras irregulares, com telhados inclinados cobertos de musgo. Quando finalmente cheguei, a aldeia parecia deserta, mas podia sentir olhos invisíveis observando cada movimento meu.
3 de Junho de 1924
Cheguei no Vale da Lua ao cair da noite, e a recepção foi tudo menos acolhedora. A atmosfera pesada e os olhares desconfiados dos moradores me causaram um mal-estar imediato. As casas, velhas e decrépitas, pareciam observar-me com olhares inumanos, e as poucas pessoas que encontrei nas ruas estreitas e lamacentas desviavam o olhar ou sussurravam entre si. Ao tentar obter informações sobre os antigos rituais de que ouvira falar, fui recebido com silêncio e hostilidade.
Investigação na Aldeia
Instalei-me na única pousada da aldeia, uma construção sombria e decrépita que emanava um odor de mofo e decadência. O dono, um homem de meia-idade com olhos fundos e expressão severa, entregou-me a chave sem uma palavra. No quarto, a mobília era antiga e desgastada, e as cortinas de veludo vermelho estavam desbotadas e rasgadas. O chão rangia a cada passo, e o silêncio era perturbador, quebrado apenas pelo ocasional uivo do vento. Tentei descansar, mas o desconforto e a sensação de ser observado mantiveram-me acordado. As sombras dançavam nas paredes, criando formas grotescas que pareciam zumbir com uma energia maligna.
Exploração da Igreja em Ruínas
Passei o dia explorando a aldeia, determinado a descobrir mais sobre os rituais mencionados em meus estudos. A aldeia era um labirinto de ruas tortuosas e becos sem saída, com casas de madeira apodrecida e pedras cobertas de líquen. A velha igreja, agora em ruínas, chamava a atenção no centro da aldeia. Seus vitrais estavam quebrados, e a porta de carvalho estava semiaberta, rangendo com o vento. Dentro, o altar estava coberto de poeira, e bancos carcomidos estavam espalhados pelo chão. Nas paredes, símbolos estranhos e desgastados pelo tempo foram esculpidos nas pedras. Havia um ar de abandono, mas também de algo sinistro mantido em segredo.
5 de Junho de 1924
Hoje, fui atacado. Ao cair da noite, saí para investigar um dos morros onde se dizia que rituais antigos eram realizados. A colina, coberta de árvores retorcidas e raízes expostas, parecia um cenário saído de um pesadelo. Na penumbra, fui emboscado por três homens de rostos sombrios e intenções assassinas. Estavam vestidos com roupas simples, mas suas expressões eram de puro ódio. Sem dizer uma palavra, avançaram sobre mim com facas e paus. Por sorte, consegui escapar, embora ferido. Rasguei minha camisa ao cair em um barranco e senti uma dor aguda no ombro ao ser atingido por uma pedra.
6 de Junho de 1924
Descobri que os moradores do Vale da Lua, ao longo das gerações, protegeram um segredo aterrador. Explorando novamente as ruínas da igreja, encontrei uma câmara subterrânea oculta por entulhos e pedras. A entrada estava escondida atrás do altar, bloqueada por um pesado sarcófago de pedra. Com esforço, consegui mover o sarcófago e descer por uma escadaria íngreme, iluminando o caminho com uma tocha improvisada.
Descoberta na Câmara Subterrânea
A câmara era vasta, com paredes cobertas de inscrições e desenhos de rituais profanos. No centro, em um pedestal de pedra negra, estava um manuscrito envolto em uma mortalha de couro antigo e preso com um cordão de prata. O documento, escrito em um dialeto arcaico misturado com símbolos cabalísticos, falava de um ser abissal, uma entidade de escuridão e caos que existia antes da criação da humanidade. Este ser, denominado apenas como “Aquele que Devora a Luz”, era adorado por um culto desde tempos imemoriais.
Mas os escritos revelavam que os rituais praticados pelos aldeões tinham como objetivo não apenas manter essa entidade adormecida, mas também canalizar seu poder para obter benefícios pessoais. As oferendas e sacrifícios humanos eram feitos em troca de promessas de riqueza, longevidade e poder. Pior ainda, os textos falavam de uma degeneração moral e física entre os participantes dos rituais, que se tornavam cada vez mais monstruosos, tanto no corpo quanto na alma. Eles se tornaram cúmplices voluntários de um mal antigo, sacrificando forasteiros e até mesmo membros da própria comunidade que ousavam desafiar as tradições.
Ao lado do manuscrito, encontrei diversos artefatos: amuletos feitos de ossos humanos, máscaras cerimoniais grotescas e lâminas ritualísticas cobertas de ferrugem. Cada objeto emanava uma sensação de malevolência palpável, como se estivesse impregnado com o sofrimento das vítimas. Peguei o manuscrito e alguns dos artefatos mais significativos, determinado a documentar e expor a verdade sobre o Vale da Lua.
7 de Junho de 1924
Compreendi finalmente a razão da hostilidade. Minha pesquisa ameaçava expor um segredo que, se revelado, desmascararia os aldeões como servos de uma entidade maligna, entregues a práticas horrendas e abomináveis. Escrevo estas linhas com pressa, pois sinto que meu tempo se esgota. Enviei este diário à Universidade de Serra Verde na esperança de que, se algo acontecer comigo, a verdade venha à luz e as precauções adequadas sejam tomadas.
Enquanto escrevo, sinto a presença dos aldeões se aproximando. Ouço seus passos no corredor. As vozes baixas e ameaçadoras ecoam pela pousada. As batidas na porta tornam-se mais insistentes. Meus olhos pesam com o cansaço e o terror, mas devo resistir. Se este diário sobreviver a mim, que seja uma advertência aos futuros pesquisadores.